03 janeiro, 2021

...Cada dia um novo hoje

Não me prenderei em amarguras...


    Muitas vezes protelei, arrastei esse momento, mas decididamente já é hora de lhe dizer adeus. Preciso de outras coisas, não preciso mais de ti. Coloquei em seu lugar uma força tão grande que não te procurarei, nem lamentarei essa perda, chega! 
    Você mais me tirou do que acrescentou. Cansei de buscar aquilo que só era bom por um momento. Eu quero sentimentos eternos, momentos marcantes de alegrias, não momentâneos. Enfim, descobri que posso viver sem você. 
   Ser livre é uma escolha muito pessoal e verdadeira quando tomamos em nós a decidida coragem. E hoje, este é meu nome, Co-ra-gem!
    Quero me ser, quero me respeitar, quero me sentir...
    Não preciso de nada emprestado, quebrado, juntado, colado. Quero o novo, o sincero, o de verdade.
    O que não adiciona, não mais me convém.
    Deixar-te, vai me deixar melhor. 
    Hoje não te quero mais e a cada dia farei um novo hoje.
    Nem hoje, nem amanhã!

02 janeiro, 2021

Bicho

 

 Em um lugar sem nome e sem dono, viviam muitos bichos. Isso mesmo, bichos, eles também não tinham nomes. Mas  o lugar era de uma beleza sem igual, de rios limpos, flores, árvores, frutos e um ar puro, tão puro que tinha cores.

Até que um dia, um dos bichos, que era grande, forte e tinha uma juba resolveu ser o rei. Assim, falou ele:

– De hoje em diante quem manda aqui sou eu!

A bicharada ficou estarrecida. Foi então que um bichinho pequeno, branquinho de dentes saltados e orelhas grandes, disse:

– Só se você lutar comigo e vencer!

É claro que o bicho de juba ganhou a luta.

Então outro bicho, até bem grande quanto o de juba, quis lutar. Foi uma luta demorada, pois o bicho era forte e de vários dentes grandes e uma boca que abria e fechava, mas seu couro cheio de relevo, dizem a bichada, o fez perder a luta.

Enfezado um próximo bicho propôs uma competição, o primeiro de ganhasse uma corrida, seria o líder.

Assim, ao sinal de um som de um bicho de penas brancas que voava com um raminho no bico, foi dada a largada.

O bicho “jubento” nem fez muito esforço, pois o outro bicho não chegou longe, devido aos cascos quebrados nas pedras do caminho.

O suposto rei fez um apelo:

– Quem será agora minha vítima?

Não é que um bicho cheio de penas que comia milho apareceu.

A luta mal começou e terminou somente com o rugir o bicho grande.

– Ah! Isso não vai ficar assim, disse um bicho parecido com o último, a diferença é que este tinha crista na cabeça, talvez por isso se “achava” capaz de ser rei.

Mero engano! Ele bem que ciscou, correu e pulou, mas de nada adiantou. O grandão venceu fácil.

E assim, o bicho grande se tornou rei. Mas todos os outros bichos eram livres e viviam em harmonia no paraíso verde.

Até que apareceu um bicho bem diferente e se dizia chamar homem, um animal racioal. Este começou a chamar o lugar de Terra e a chamar a bichada de animais.  Prendeu o bicho grande e muitos outros bichos num lugar de nome zoológico. O homem deu ao bicho-rei o nome de leão.  A outros bichos, disse o homem, seria de estimação. Mas a maioria dos animais foram presos ou sacrificados.

Ao bicho branco peludo de orelhas grandes e dentes saltados, deu o nome de coelho. O homem disse ao coelho:

– Seu pelo dará um excelente cobertor! O pobre coelho não sabia o que isso significava cobertor.

O bicho grande de couro estranho se escondeu no rio, mas o homem o caçou e tirou seu couro e fez sapatos para seus pés e bolsa para carregar bugigangas.

Ao bicho, que propôs a corrida, deu o nome de cavalo e fez a ele uma espécie de calçado nas patas – gesto nobre até então – e o fazia puxar um caixote de madeira carregando-o para cima e para baixo, fora as mercadorias pesadas, fosse noite, fosse dia. Se ele negasse a sair do lugar o xicote cantava no lombo.

O bicho que voava com um raminho no bico, passou a se chamar pombo-correio e em troca de comida levava em seu bico recados por toda a redondeza. Às vezes pensava em fugir para bem longe dali, mas para onde ir?

Ao bicho de penas deu o nome de galinha, que perdeu suas pequenas por algo com nome de travesseiro, além de ter a promessa do homem de que ela seria almoço de qualquer domingo. E foi!

O último bicho que lutou com o agora chamado leão, foi chamado de galo e incumbido de toda manhã bem cedo, faça sol, faça chuva, acordar o homem, mas o pior é que o pobre era obrigado a lutar com os mesmos de sua raça, pois isso era diversão.

Depois disso, o bicho, digo, o homem passou a mandar e a nomear tudo.

Encontro

Antes de ti eu esbarrava na vida,
Ela me cegava, maltratava.
Como dedos que apertava para sufocar,
Como quem olhava para o pavor.
O tempo não aliviava minha dor.
Pelo contrário, cortava como faca,
Eu via sangue, sentia medo.
Eu me batia nas paredes feito bêbado,
Para machucar meu corpo, meu ínfimo.
Meu jogo era cair, perder-me.
Eu ria para o espelho, feito louca.
Ria por fora e chorava por dentro.
Travei uma guerra pessoal.
Eu falava alto, gritava.
Ninguém me ouvia.
Marquei um encontro.
Preparei-me como há muito não fazia.
Cuidei da pele, do corpo e da alma.
Tudo nos mínimos detalhes, com as melhores roupas, os melhores enfeites.
Cuidei de tudo pessoal e verdadeiramente.
Dia e hora marcados, lá fui eu ao encontro. 
Vi-me como sou.
Pedi-me perdão.
Encontrei-me.

Frio


Frio


O frio que mais congela

Não é o que entra pela janela

Não é a falta de cobertores

Nem a falta de aquecedores

 

É a palavra maldita e mal dita

É falta de abraço

Fria que ultrapassa

Qualquer geada

 

Roupa que não se usa

Fica bem em quem não tem

Sapato que te aperta

Aquece os pés de alguém

 

O frio que mais congela

É a estupidez de quem pode

E não faz nada por alguém

Pense, faça o bem.



Inverno em mim


Ouço o vento
e nele o encontro e
desencontro das folhas.
Quase uma oração
entoada pela força,
pela imensidão do vazio.
Vejo as folhas soltas
e meus pensamentos
também voam.
Levo-me no ar
e na prece te peço
para voltar.
Então meu coração
canta um ritmo antigo.
E com ele me deixo
sonhar.
Folhas ao vento
me lembram aquele alguém.
Aquele que não soube me amar.
Então, deixo ir como folhas ao vento.
Comigo ficou o frio da falta.
Da falta de amor.
Sem você sempre será inverno
em mim.

Sei lá

É dia e não tenho vontade de mais nada, a não ser viver.

Gosto de intensidade, de verdade. Se for pra ser feliz que seja por inteiro, se for para ser triste que seja de uma vez. Nada pela metade me agrada, nem laranja.

Algumas pessoas levaram muito de mim, mas não fui inteiro. Pensando bem: não levaram nada!

Como posso não sentir? Meu coração não é de pedra.

Algumas pessoas dão grande importância ao primeiro amor. Já eu dou ao último. O que não durou, não existiu, simples assim. 

Nada do que sinto é pouco, só não sei explicar. Às vezes sou mel, noutra sou fel, mas sempre eu mesma.

A ventania dos meus pensamentos é célere, não se prende. Talvez seja por isso que busco o equilíbrio em uma corda bamba. Talvez seja meu pensamento andando mais rápido do que eu. Talvez seja minha vida no lado errado de mim. Penso que ainda vou me achar.

Como dizer adeus sem sofrer? Quero viver!

Tenha consciência que em tudo e para tudo existe um espaço: dia – noite – vida – morte, riso – lágrima...

Aproveite para fazer a diferença aqui!



24 fevereiro, 2014

Maria Clara





                                                                                Maria Clara
     

       Faz um mês que estive numa consulta médica. Fui sem marcar horário, porque não estava me sentindo bem. Como sabia que iria ter que esperar levei um livro, não para ler, mas para não precisar conversar (não que eu não goste), mas porque este momento de minha vida, o bate-papo não seria espontâneo.

 Enquanto as pessoas que ali estavam liam revistas, falavam e teclava em seus celulares, eu fingia que lia o livro que estava em minhas mãos. Meus pensamentos estavam doloridos demais, tanto quanto meu corpo. Foi então que uma senhora entrou acompanhada de uma menina de touca azul, que cumprimentou a todos (poucos responderam). Ela sentou-se ao meu lado e se apresentou: – Oi, eu chamo Maria Clara e você? Respondi com meio sorriso. Ela perguntou se eu estava conseguindo entender o que estava lendo, pois o meu livro estava de ponta cabeça. Ri baixo e lhe disse que na verdade eu não estava tentando ler, apenas queria ficar “na minha”. Ela, sem mais nem menos, começou a me encher de perguntas.

A mãe da menina, que estava sentada do outro lado da sala, de vez em quando olhava em nossa direção e sorria, parecia triste, mas era uma mulher muito bonita, assim como Maria Clara.
    A secretária veio e nos disse que o médico realmente iria demorar a nos atender, pois estava cuidando de uma emergência, e nos alertou que, caso alguém quisesse remarcar para outro dia, podia acompanhá-la. Confesso que tive vontade, mas, por outro lado, já que eu estava ali, iria aguardar.

      Maria Clara perguntou se eu trabalhava, respondi que eu cuidava da minha casa. Ela falou inocentemente: – Cuidar da casa não é trabalho, é obrigação. Mas é bom, né? Porque ninguém cobra nada! (ela que pensa!).  Foi aí que ela me conquistou! Quando me dei conta estávamos conversando como amigas, embora nossa diferença de idade fosse grande, mas para ser/ter amigos basta existirmos.

Entre tantas perguntas que ela me fez, como qual a minha cor favorita, meu prato predileto, minha melhor amiga etc., ela me perguntou se eu sofria pela perda de alguém. Respondi que sim – do meu pai (nos difíceis momentos que tenho passado, sinto muito a falta dele. Ninguém saberia me abraçar como ele). Ela segurou minhas mãos e falou: – Quem a gente ama, nunca morre! Segurei minhas lágrimas e pensei que era bastante sabedoria para uma criança de sete anos. Contudo, pensando melhor, como alguém tão pequena poderia me dar lição de vida? Afinal, ela não sabia nada da vida, muito menos da minha. Para quebrar aquele momento estático, perguntei-lhe: – O que você quer ser quando crescer? Ela respondeu: – O mesmo que sou hoje – feliz! Todos que ali estavam nos olhavam com uma expectativa em mim. Eu lhe abracei como se abraçasse minha filha.

Maria Clara continuou me contando sobre ela: que tinha um irmão mais velho (que era adolescente) e que, ainda assim, era boa pessoa (resisti, mas não perguntei por que); que amava o Brian (seu cachorro, mesmo sendo velho); que amava desenhar nuvens (porque não precisava exatidão); sua cor preferida era o azul-céu; e que ela tinha o melhor pai e mãe de todo o mundo inteiro (exatamente com essas palavras), assim como você, porque os nossos são sempre os melhores, né?! Concordei com a cabeça e com o coração.

 

     O tempo que passei esperando ficou curto com a presença daquela menininha, que foi atendida antes de mim (eu tive que esperar mais meia hora). Quando ela e a mãe saíram do consultório, ela correu me abraçar disse: – Seja feliz! A mãe dela também me abraçou. Percebi que tremia e com a voz embargada me agradeceu (eu quem estava grata por ter conhecido Maria Clara). Senti vontade de pedir o telefone, mas não o fiz.

 

     Um mês depois, voltei ao médico para levar meus exames e, naquela mesma sala de espera (só que menos cheia, pois o médico estava no horário), pensei em Maria Clara. Decidi pedir à secretária o telefone. Com minha habitual educação, falei sobre aquele meu dia com Maria Clara, aquela adorável menina... A secretária não esperou eu terminar: – Ela morreu, sinto muito!

 

     Quando saí do consultório, olhei para o “azul-céu” com uma nuvem sem “exatidão”.  Chorei!








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